A partir de agora, salvar vidas em perigo, principalmente em situações de emergência nos hospitais e ambulâncias, pode se tornar mais fácil. Na semana passada, o governo americano aprovou a venda de um dispositivo que irá permitir aos médicos ter acesso ao prontuário de um paciente em questão de segundos. O aparelho é um chip do tamanho de um grão de arroz, que deve ser implantado sob a pele do braço. Nele, há um número em código de barras. Quando necessário, o médico passa um scanner pelo chip e o código é transmitido para um banco de dados que dá acesso rápido a todas as informações relevantes sobre a saúde da pessoa: tipo sanguíneo, histórico de doenças, alergia a determinadas substâncias, índice glicêmico, entre outras informações. Segundo a empresa Applied Digital Solutions, que fabrica o dispositivo, batizado de VeriChip, o sistema pode evitar erros médicos que costumam ser causados pela falta de informação sobre os pacientes. Qualquer cidadão que queira se precaver pode implantar o chip. A operação leva vinte minutos, tempo necessário para aplicar uma anestesia local, injetar o dispositivo através de uma seringa e fazer um curativo. Inicialmente, o VeriChip será vendido por 200 dólares.
O aval do governo americano a determinado procedimento médico é geralmente acatado no exterior, inclusive pelo Brasil. Em diversos países o implante de chips subcutâneos é empregado há vários anos em animais domésticos. Dessa forma, eles podem ser encontrados por seus donos caso se percam ou sejam roubados. Em seres humanos, o sistema começou a ser usado, em caráter experimental, há dois anos. Na época, o dentista americano Jeffrey Jacobs, sua mulher, Leslie, e o filho do casal, Derek, se ofereceram para testar o chip por causa do histórico de doenças na família. Jacobs teve câncer e seu filho é alérgico. A família está até hoje satisfeita com a experiência, embora sejam ainda poucos os hospitais e clínicas nos Estados Unidos equipados para ler os chips.
Fora dos Estados Unidos, o sistema tem sido usado para outros fins. O secretário de Justiça do México, Rafael Macedo de la Concha, anunciou recentemente que ele e sua equipe implantaram os chips para controlar o acesso a uma sala de segurança máxima que guarda documentos considerados fundamentais na luta contra os cartéis do narcotráfico naquele país. Cerca de 1.000 cidadãos mexicanos já instalaram chips para controle médico. Há quatro meses, a casa noturna Baja Beach Club, de Barcelona, na Espanha, adotou o sistema de chip para evitar filas no caixa. Os freqüentadores mais assíduos são estimulados a implantar o chip, que nesse caso funciona como um cartão de crédito. Na hora da saída, o código de barras os identifica e a despesa de cada um é registrada. Posteriormente, a boate manda a fatura para a casa do freguês. "É uma forma de oferecer um atendimento melhor a meus clientes", diz Conrad Chase, proprietário da casa, que já convenceu cinqüenta pessoas a implantar o chip. O mesmo sistema foi adotado numa casa noturna de Roterdã, na Holanda, onde 35 pessoas implantaram o aparelho.
Prevê-se que, no futuro, o VeriChip poderá ser usado também em sistemas de segurança. A empresa que fabrica o equipamento apregoa que ele seria de grande utilidade em locais que exigem monitoramento ostensivo, como presídios, usinas nucleares e órgãos do governo, por exemplo. Em lugares como esses, leitores de códigos de barras colocados estrategicamente nas portas poderiam identificar todo mundo que entra e sai dos recintos. A Applied Digital Solutions diz que, a partir de agora, o desafio é acabar com a resistência de alguns setores da sociedade com relação ao VeriChip. A principal delas parte daqueles que enxergam nele uma ameaça à privacidade. O Electronic Privacy Information Center, uma entidade jurídica de Washington voltada para o interesse público, adverte que será grande a tentação de criar leis determinando o implante de chips em presidiários, condenados em liberdade condicional e - em tempos de terrorismo internacional - até em visitantes estrangeiros que chegam aos Estados Unidos. "Acreditamos que os benefícios proporcionados pelo VeriSign na área médica irão contribuir para dissipar as desconfianças", diz Scott Silverman, diretor da Applied Digital Services.
O passaporte inteligente
Desde os ataques de 11 de setembro de 2001, o governo Bush vem criando mecanismos para reunir o máximo de informações sobre quem entra nos Estados Unidos. Como parte desse esforço, encontra-se em fase de testes um passaporte que tem um chip acoplado. O dispositivo conteria mais informações sobre o viajante além daquelas registradas no papel e permitiria obter os dados através de equipamentos de leitura ótica. O passaporte seria usado pelos americanos e obrigatório também para os cidadãos de países dos quais não se exige visto para entrar nos Estados Unidos.
O problema é que os dados armazenados no chip, cuja tecnologia usa radiofreqüência, poderiam ser acessados não apenas pelos funcionários dos aeroportos, mas por qualquer pessoa que tivesse um equipamento eletrônico de leitura do sistema. Dessa forma, seria possível a alguém com o equipamento adequado descobrir o nome e qualquer outra informação contida no chip sem o conhecimento ou o consentimento do dono do passaporte. "Isso significa que ladrões de bagagens, seqüestradores e até terroristas também terão acesso fácil às informações", acredita Bruce Schneier, especialista em segurança de tecnologia. As autoridades americanas não parecem muito preocupadas com esse risco. Se forem aprovados nos testes, os passaportes com chip começarão a valer a partir do ano que vem.
Fonte: Revista Veja por Rosana Zakabi
25/10/04